A imigração ilegal na Europa toma, nos últimos anos, caminhos nunca antes previstos pelas autoridades do continente. Os números daqueles que tentam transpor barreiras de todos os tipos – culturais, sociais, econômicas e políticas, crescem progressivamente, demonstrando que a aspiração daEuropa enquanto refúgio ainda é uma constante na mente de inúmeros imigrantes que buscam naquele continente as possibilidades de concretização dos direitos que foram e ainda são professados enquanto universais.
Neste ponto, é colocado no presente trabalho uma visão sobre o mar e sua função histórica de ponte para imigração. O mar aqui mencionado é o Mediterrâneo; e toda a sua historicidade permeia a intenção de apresentá-lo como catalisador da esperança de todos os africanos que o atravessam todos os anos em direção a países europeus. Aqui, percebe-se que a busca por vida digna, seja na forma básica de trabalho seja na busca por refúgio político e asilo, é o divisor comum nas mentes dos que se arriscam nas embarcações precárias que atravessam estas águas.
Recentemente, a mídia noticiou o fluxo de imigrantes ilegais que saía do norte da África em direção à Itália; mais precisamente a ilha de Lampedusa, que vêm recebendo um número bastante elevado de africanos. Estes últimos vêm, em grande parte, das regiões que passam atualmente por crises de grande intensidade, como a Tunísia e a Líbia, países nos quais as agitações políticas e a iminência de uma guerra civil geram perseguições, fome e desemprego.
A título de exemplificação, a ilha de Lampedusa possui uma população de aproximadamente cinco mil habitantes, cuja ocupação principal é a pesca. Em contrapartida, o número de africanos que para lá imigram ilegalmente ultrapassa o da população nativa, “transformando a ilha em um campo de refugiados a céu aberto” – reportagem da folha de São Paulo do dia 05/09/11. Em março deste ano, a Itália recebeu nos dias 13 a 15, cerca de 5000 imigrantes, fato este que levou o governo do país a recorrer à União Europeia para obter orientações de como lidar com a situação.
Farol de luz de embarcação da guarda costeira da Itália mira barco com imigrantes encontrada na costa da ilha de Lampedusa
Trata-se, pois, de uma questão humanitária, que demanda políticas internas e externas, uma vez que o problema deve ser enfrentado tanto pelo Estado e sociedade italianos quanto pela sociedade internacional já que o que motiva as imigrações são frutos da vulnerabilidade política e econômica de muitas nações africanas; vulnerabilidades que nascem na esfera colonial que no continente se assentou pelas mãos europeias.
Barrar imigrantes vêm sendo uma política dominante dos países da Europa. Entretanto, estas ações não são nada mais que paliativas, já que o problema não é conjuntural, mas sim estrutural, na medida que a imigração representa aspirações humanas de grupos que, se não vivessem em situações de pobreza extrema e vulnerabilidade, não teriam de imigrar em massa.
Há ainda mais agravantes à crise. Em primeiro lugar, podemos enxergar a aversão ao estrangeiro que se manifesta em partes cada vez maiores das populações dos países receptores destes contingentes populacionais. A xenofobia vem fazendo há cada dia mais vítimas; preconceito, violência física e moral e tantas outras manifestações contra imigrantes demonstram que estes são vistos como intrusos, estranhos e tomadores de lugares que deveriam ser ocupados por aqueles que deveras pertencem aos Estados europeus.
Fiscalizar o Mediterâneo e muitas vezes forçar as embarcações a voltarem parece não ser medidas ideias para aqueles países que fundamentaram e fundamentam o que hoje chamamos de Direitos Humanos Universais. Populações que apoiam que milhares de africanos sejam deixados à deriva no mar também não parecem atitudes plausíveis para aqueles que vivenciam o Estado de bem estar social. O problema, como já foi dito anteriormente, é estrutural, não bastando apenas repressão e fiscalização para que seja resolvido.
A crise social que muitos governos, mídias e opiniões públicas preconizam parece não ter nestes sujeitos explicações e soluções que entendam de fato a realidade que se torna cada vez mais clara e ao mesmo tempo mais obscura. A historicidade das nações africanas, sua colonização e opressão, devem ser tomadas por base para uma análise racional e humanitária do assunto. Sem isso, soluções serão apenas medidas retardadoras, pois a crise não será resolvida unilateralmente, mas apenas com a implementação de políticas e ações que contemplem e entendam muito mais os problemas africanos do que os europeus, uma vez que o fluxo visto hoje nada mais é do que a inversão previsível daquilo que se constituiu o colonialismo e neocolonialismo, idealizados, majoritariamente, pelas nações da Europa.
O mar representa neste contexto a ponte que separa a realidade de pauperização e opressão de povos africanos da esperança de encontrar alhures asilo, ou pelo menos oportunidade de vida digna dentro do possível. Não podemos mais falar do Mediterraneo apenas pelo viés geopolítico e econômico; necessita-se abranger o leque de suas não tão novas capacidades: um mar em sua faceta humanitária e social.
ONDA de imigração atinge Itália por crise no norte da África. Disponível em:
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